segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Professor Sandro - História

O REFERENDO

Diante de câmeras de TV e de algumas dezenas de apoiadores,no salão Ayacucho do Palácio Miraflores, Hugo Chávez amargava,no final de 2007,sua primeira derrota eleitoral em nove anos.A diferença era pequena:1.41% ou 124.962 votantes em um universo de 8.883.746 votos validos.Sua proposta de alterar substancialmente a constituição do pais,aprovada em seu primeiro mandato,oito anos antes,fora reprovada em um referendo popular.(pág.27)

Havia várias novidades no resultado,A primeira era que os vitoriosos não foram exatamente os setores da direita golpista,como o mandatário chama os articuladores da desastrada tentativa de tira-lo do poder á força,em abril de 2002.Tais correntes pregavam,até três dias antes da votação,o absenteísmo.Argumentavam que o resultado provavelmente seria fruto de uma fraude e o melhor seria ficar de fora. Era um caminho aparentemente lógico . Em vários embates,nos anos anteriores, a oposição buscara atalhos fora da institucionalidade,na tentativa de abreviar o mandato presidencial.Além do golpe 2002, tais setores tentaram um locaute de dois meses, articulando a partir da PDVSA, a estatal petroleira,e resolveram participar das eleições parlamentares de dezembro de 2005. Colheram desgastes, ficaram fora do congresso,viram suas bases sociais encolherem e acabaram por se dividir.(pág.28)

Até a consulta popular de dezembro de 2007, Chávez valeu-se de um discurso que empurrou a direita para a defensiva. Colocou-se como campeão da legalidade,ao exibir a todo momento, um exemplar em miniatura da constituição de 1999. “É nosso programa“ repete ele. Convocou eleições, chamou milhares de pessoas ás ruas e inverteu um jogo comum em todos os países. Geralmente é a esquerda quem se coloca contra as regras do jogo e deixa a direita de mãos livres para alardear uma pretensa ordem a ser mantida.(pág.28)

Na  Venezuela , os sinais foram trocados.É a direita quem,aos olhos da população, representou a instabilidade e o desrespeito ás leis definidas pela maioria. E em todos os embates, desde 1999, ela levou a pior. (pág.28)

Essa desvantagem crônica foi vencida no referendo por uma tática, que se mostrou acertada, de se buscar enfrentar Chávez nas regras por ele estabelecidas. O que isso pode significar? Em primeiro lugar, a existência de uma situação inédita no Pais.Há uma oposição não golpista,assentada nas mesmas bases sociais da anterior – meios de comunicação, poder econômico e governo dos Estados Unidos – Que, tudo indica,muda qualitativamente o panorama político local.Possivelmente,o discurso chavista terá de se reciclar.Até ali,valeu mais acentuar uma polarização,na qual estariam,de um lado, o povo e,do outro, o imperialismo norte-americano. A situação mostrou-se verdadeira por várias vezes.A interferência estadunidense na política interna da Venezuela aconteceu entre todo século xx e no inicio deste.Pórem ela nem sempre se valeu das mesmas formas de intervenção, como será mostrado nos próximos capítulos.(pág.28)

Em seu discurso no salão Ayacucho,Chávez admitiu:”A abstenção nos derrotou”.mais adiante,emendou”Milhões de venezuelanos que há um ano votaram em nós, não vieram votar “. O presidente referia-se a vitoria na eleição presidencial do ano anterior,quando obteve 7.161.637 votos. A abstenção,na época foi de cerca de 25% a menos desde 1994. No referendo apenas 4.379.392 apoiaram o governo. Na Venezuela ,o voto não e obrigatório.
A pergunta parada no ar é: por que quase três milhões de apoiadores do presidente não foram votar dessa vez? O caso também contrasta com o numero de filiados do Partido Socialista Unificado da Venezuela (PSUV),lançado por Chávez em dezembro de 2006. No dia 23 de junho de 2007,a Rádio nacional da Venezuela que as “jornadas de inscrição levadas a cabo em todo pais para a postulação a aspirantes e militantes do PSUV lograram reunir 5.669.305 membros”. Ou seja 1.289.913 a mais do que os votos obtidos por Chavés.
Pode-se interpretar tais números, dizendo-se que não foi a oposição que ganhou, e sim o governo que perdeu, e por uma pequena margem.Mas isso não serve de consolo para amenizar a situação.
Quando diz que a abstenção ganhou, Chávez aponta um dado real, mas não a causa do problema. O que levou mais de um milhão de chavistas a ficarem em casa naquele domingo 2 de dezembro?Por que não se animaram as 34 propostas de emenda editadas pela presidência da republica,mais as 35 adicionadas por sua base de apoio na Assembleia Nacional?(pág.29)




O mote de que votar sim a reforma seria escolher Chávez e votar não seria apoiar Bush, brandido pelo presidente venezuelano na reta final da campanha, exibe um grau de confrontação  inadequado para uma iniciativa pouco debatida e menos ainda entendida pela população, como é o caso do projeto de reforma constitucional.Chavéz as mudanças seriam o primeiro passo para a implantação de seu projeto de socialismo do século 21.(pág.29)



A conjuntura na qual se deu  o referendo foi desenhada a partir da acachapante vitoria de Chavéz nas eleições presidenciais de dezembro de 2006. O presidente obteve 62.8% dos votos válidos, o que levou o candidato direitista Manoel Rosales com 36.9%, a lona.A abstenção,no entanto,fora muito maior: 35%. Em 8 anos Chavés invertera a apatia histórica do eleitorado que alcançara 54% de ausência nas eleições de 1995.
No fim de 2006, Chavéz estava mais forte do que nunca. Enfrentara um golpe de estado.um locaute nacional de dois meses,uma queda de 17% do PIB em 2003,a antipatia generalizada da grande imprensa dentro e fora de seu pais e varias tentativas de isolamento internacional.Alem disso,seus oponentes tentaram marca-lo como ditador, louco, fantoche de Fidel Castro, demagogo caribenho,falastrão e trapalhão.As acusações não colaram e sua popularidade aumentou.(pág.31)


Pesadas bem as coisas,a derrota no referendo foi construído involuntariamente pelo governo ao longo de um ano. Julgando dispor de uma confiança ilimitada por parte da população, o chamado oficialismo se surpreendeu com um resultado para o qual não estava preparado.
Para o sociólogo Edgardo  Lander, a consequência imediata é “ o rompimento do mito do dirigente messiânico, seguido por uma massa popular incondicional, carente de capacidade de fazer juízo político próprio” apoiador critico do governo, Lander é rigoroso em sua avaliação:

A população,que foi submetida praticamente a uma chantagem política(escolher entre Chávez e bush), demonstrou ter autonomia e capacidade para, através da manifestar um estado de mal-estar e fazer um chamado de alerta.

O referendo acabou por se mostrar como uma precipitação desnecessária. As reformas não tinham a urgência toda apregoada pelo governo, que se descolou de parte de sua tradicional base de apoio. Produzida de afogadilho,sem debates maiores com a população e apresentado como um pacote fechado a reforma não empolgou.Apresentadade forma mais ampla a trinta dias da votação, era impossível decidir seu destino num simples “sim” ou “não” .
Investindo reiteradamente na polarização de posições,a ação governamental acabou por restringir o espaço para o exercício de uma saudável critica interna ao processo,que não raro é rotulada de iniciativa anti-revolucionária.
Uma ressalva precisa ser feita. Nenhum governo venezuelano recorreu tantas vezes a consultas populares. E,derrotado Chávez fez o que se esperava:acatou os resultados,apesar das constantes acusações da mídia internacional do que seria um ditador.(pág.37)


No balanço de forças pós referendo,há um saldo a se notar. É o surgimento de um novo segmento oposicionista como já dissemos paginas atrás. Perderam força os setores golpistas , da remanescentes da trapalhada palaciana de 2002. Tais grupos vinham conseguindo manter sua hegemonia entre os antichavistas desde aquela época. Por extrema inabilidade fizeram o que Chávez queria e apresentaram-se como opositores de conquistas reais por parte da população. Perderam espaço para novos atores, organizados em torno de um movimento estudantil que tenta romper, pelo menos aparentemente os laços com a oposição tradicional.
Em outras palavras,Chávez tem diante de si uma oposição não golpista,uma direita que aceita suas regras do jogo, em um processo de acumulo paulatino de forças. É algo novo em um cenário anteriormente polarizado, no qual ele soube se movimentar com desenvoltura.A situação ficou mais complexa e exige maior habilidade política. Como se comportara o governo a partir de tais parâmetros?(pág38)







                               





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